quinta-feira, 5 de maio de 2011

Sobre quando as pessoas se vão.

Prazer, sou uma concha dentro de uma concha dentro de uma concha e dentro de mais uma concha*.

As imagens que me vem à cabeça não são de agora, nem mesmo de alguns anos atrás. São lá de longe, de um tempo despreocupado e despretencioso que cada um de nós tem - ou deveria ter - o direito de viver, pelo menos uma vez na vida. Sinto cheiro de domingo ensolarado, como quase todos os domingos do meu Seridó, vejo uma Brasília amarela a me esperar com meu pai na direção, para na companhia da minha Vó Anália e da minha tia Salete Cabral irmos para o outro lado da cidade para a casa de uma outra tia - é, minha gente, para o ângulo de visão de uma criança, existia "o outro lado da cidade" na Currais do início dos anos 80. E nossa, como parecia longe o trajeto até chegar num mar recheado de bandinhas, zorros, pipocas bokus e vontades atendidas durante todo o domingo. Às vezes nosso animal de estimação, o papagaio, nos acompanhava. A farra com ele ficava completa, subia pro depósito/quintal, tomava banho de mangueira só de calcinha (daquelas de pano, com babados) e passava o dia cantando pra ele aprender. Salete Cabral armava uma rede, colocava algum vinil pra tocar e esquecia que o mundo existia me olhando brincar. Vovó? Aparecia de vez em quando pra dizer que já tava na hora da brincadeira acabar, mas logo era absorvida pela atenção que despendia para a minha outra tia, a sua preferida, a dona da casa e das bandinhas e dos zorros e das pipocas bokus. Tia Aparecida, casada sem filhos, mais um motivo pra permitir que pintasse e bordasse em sua casa todos os domingos. E assim foi, durante boa parte da minha deliciosa infância. Segunda passada ela resolveu que tava na hora de nos deixar e assim o fez. Não é uma notícia boa de se receber em circunstância alguma, mas estar a alguns mil quilômetros de distância só dificulta as coisas. Nessas horas, por mais que a gente se engalfinhe com os que compartilham o mesmo sangue nas veias, o que a gente quer mesmo é tá junto, pra tentar dividir a dor. Não foi possível pra mim. Passei a semana evitando esse texto, lendo e querendo escrever sobre outras coisas, não saiu nada. Então, decidi me render. Nessas horas fico mais cética que nunca, maaaass... se tudo isso que falam for verdade, Dona Anália tá mais do que feliz com a preferida dela por perto e assim, me sinto feliz também.




*Pegando o termo emprestado de uma grande amiga que se auto-define assim há mais tempo que eu. Mais sábia que eu, ela.

Um comentário:

  1. "Dona Anália tá mais do que feliz com a preferida dela por perto..."
    Tenha certeza disso!

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